domingo, 21 de abril de 2013

LIVRO MORREU ALGUEM AI? AUTOR Anesio Silva As memórias de juventude de quem viveu uma época de ouro do bairro Retiro 1ª Edição Volta Redonda 2013 AGRADECIMENTOS A Deus, em primeiro lugar, por me permitir escrever e publicar, pela primeira vez, um livro. A minha querida filha, Lívia Eller, pelas sugestões e pela paciência que teve ao corrigir e editar esse livro. A minha esposa Nilza, pelo apoio nesta obra. Aos ouvintes do programa de rádio Semeando com Jesus e os irmãos do Ministério Batista da Graça do bairro Açude, pelo incentivo. A minha amiga e poetisa Liê Ribeiro, pela ajuda na publicação deste livro. E a todos os amigos citados aqui, que protagonizaram essas histórias. SUMÁRIO Nota do Autor............................................................................02 Capítulo I: Zé Mineiro..........................................................03 Capítulo II: A turma..............................................................09 Capítulo III: Atividades.........................................................19 Capítulo IV: Vamos a la playa?.................................................25 Capítulo V: Mais histórias........................................................30 Capítulo VI: Morreu alguém aí?.......................................... NOTA DO AUTOR Quando vocês tiverem em mãos este trabalho, com certeza hão de estranhar o título deste livro. Mas, à medida que forem lendo e vivendo comigo esta historia, irão entendê-lo perfeitamente. Este trabalho tenta retratar uma juventude da qual eu participei e dela extraí inúmeras historias e aventuras vividas ao lado dos meus amigos. Vou demonstrar aos leitores que, para se divertir em grupo, não precisa se drogar e nem gastar muito dinheiro. Naquela época, todos nós levávamos uma vida simples e de pouca ambição, aproveitando o que a natureza nos oferecia. Boa leitura e divirtam-se! Anésio Silva Capítulo I ZÉ MINEIRO Zé Mineiro é o nome do personagem que vai dar inicio a esse livro. Era um homem de aproximadamente setenta anos de idade, mas possuía uma alegria e vitalidade que deixava muito garotão de nossos dias envergonhado. Bem falante, gostava de contar muitas bravatas da sua juventude, que nos ouvíamos embevecidos (embora duvidássemos da veracidade da maioria delas). Suas narrativas eram temperadas por doses generosas da roxinha, da branquinha e do barril...as quais era o próprio fornecedor. Não pensem vocês que ele era um ‘bebum’ qualquer e nem que estivéssemos ali apenas porque a bebida era facilmente consumida. Não, nosso interesse era realmente conviver com essa pessoa tão divertida. Ele era o ‘promoter’ da nossa rua e organizava festas quase que semanalmente e elas eram, de fato, muito animadas. Sua própria família o auxiliava no preparo das festas e sua casa era diariamente visitada por nós. Formávamos um grupo de jovens muito animados e quase todo ele era formado por filhos de moradores antigos do nosso bairro. Havia também meninas em nosso grupo e éramos todos grandes amigos. Jamais se formou qualquer par romântico nesse grupo. Tudo isso durou até o dia em que Zé Mineiro e sua família deixaram nossa rua, que nunca mais foi a mesma...nunca mais ... E eu não poderia deixar de narrar uma de suas melhores historias: É A MESMA DISTÂNCIA, SEU CAPITÃO Zé Mineiro cuidava de uma propriedade e estava em litígio com a proprietária do sitio vizinho. Os dois viviam às turras e tudo por causa de uma bendita cerca. Maria-Homem era o apelido de sua desafeta e, como dá pra imaginar, era uma mulher muito valente. A justiça foi chamada e ela veio em forma de uma guarnição comandada por um sargento (mas que na historia de nosso herói, foi imediatamente promovido a Capitão). Vou reproduzir aqui, como testemunha ocular do fato, o dialogo entre Zé Mineiro e o Capitão: _Zé Mineiro, venha até aqui! _ É a mesma distância, seu Capitão! Devo esclarecer que o Capitão falava de uma pequena elevação do terreno, enquanto nosso herói estava na parte baixa, onde cuidava de uma pequena horta. O Sargento desceu rápido e furioso com aquela afronta e deu uns safanões em Zé Mineiro. Bem, isso foi que meu vizinho Paulo César e eu presenciamos ali, assustados. Mas...na historia do nosso herói, tudo se resumia em uma frase: “RRROLEI COM O CAPITAO NA POEIRA E ELE FOI EMBORA DERROTADO LEVANDO SEUS HOMENS!” Zé Mineiro contava essa façanha carregando nos ‘erres’ e nós quase morríamos de rir. Quem haveria de desmentir tamanho ato de heroísmo, não é mesmo Paulo César? ZÉ MINEIRO, CABO ELEITORAL Era época das eleições e, naquele tempo, embora ainda não pudéssemos votar, participávamos ativamente do processo eleitoral no apoio ao candidato de nossa simpatia, fazendo panfletagens, colocando faixas e cartazes até o dia das eleições, quando fazíamos a famosa ‘boca de urna’. A figura mais importante da equipe de apoio era a do cabo eleitoral, que trabalhava na coordenação. E adivinhem quem era o cabo eleitoral da nossa equipe? Ele mesmo: o Zé Mineiro! Ele organizou um palanque em frente a sua casa do para um grande comício do candidato a prefeito da época, que era o engenheiro Barroso. O comício era uma festa! Tinha musica, queima de fogos e, sobretudo, discursos. Havia também entre nós um cover do cantor Martinho da Vila que era considerado um verdadeiro Showman animando a festa. Enquanto prosseguia o comício do candidato apoiado por Zé Mineiro, algumas quadras à frente também estava acontecendo o comício do outro candidato. Quando terminaram os dois comícios, começou a guerra: O serviço de alto falante do outro grupo passou a provocar o nosso pessoal. Uma vez que eles eram além de adversários políticos, moradores de outra parte do bairro que, por questão de demarcação de território, eram também nossos desafetos. O pau quebrou definitivamente. Foram socos, pontapés e rasteiras pra tudo quanto era lado. Carlim-Fumo que, como eu, adorava uma boa briga, não perdeu tempo e entrou firme na peleja. Depois de muito tempo (e muito carro com os vidros estilhaçado), a pronta intervenção de Zé Mineiro, munido de um megafone, conseguiu serenar os ânimos. Quando a policia chegou, já havíamos nos dispersado e, graças ao carisma de nosso líder, tudo acabou bem naquela noite. Amigos, esta foi apenas duas das inúmeras historias do nosso herói mas, no decorrer desta narrativa, ainda irão desfilar muitas outras interessantes e engraçadas pois Zé mineiro era o máximo, a alegria da nossa juventude . Aguardem a próxima! Vocês vão se divertir com a ‘historia do Burrrrão’. Capítulo II A TURMA Deixe-me apresentá-los: Começarei pelo Paulo César, que já foi citado e era o maior gozador entre todos nós. Carlim-Fumo, que era seu irmão, também não ficava para trás. Só que tinha um porém: Ô rapaz medroso! Também havia o Jorge-Perereca, o Lili, Paulinho (meu irmão), Dirceu e Zé-Grilo, Bonitinho, Totonho, Edson, Daniel, Tadeu, Afonsinho e Caramba (Esse último foi quem inspirou este livro. Mais tarde vocês irão entender o porquê.) Não fazíamos parte de nenhum clube do Bolinha, pois em nossa turma também havia as meninas: Venina, Nilzete, Regina Célia (minha irmã), Regina (irmã do Caramba), Dirce e Eremita (eram irmãs de Zé Grilo e Dirceu e todos eram filhos de Zé Mineiro), Fátima, Celeste, Euvirinha, Dalva e outras. Éramos totalmente diferentes dos jovens de hoje. Querem um exemplo? Em nosso tempo não havia vídeo game, nem Shopping Centers e, além disso, que turma de jovens hoje em dia admitiria um senhor idoso entre eles? Ainda mais se, de certa forma, ele liderasse o grupo promovendo até mesmo nossas atividades? Apesar de não termos vídeo game nem Shopping, desfrutávamos de diversões bem melhores: Tínhamos o Açude, onde até à noite íamos nadar. Havia também as cachoeiras e o poção Cinco Manilhas. Infelizmente, essas maravilhas de águas cristalinas estão apenas na memória, pois hoje tudo o que resta é uma galeria mal cheirosa que recebe esgoto e lixo. Já que falei em muitas águas, quase ia me esquecendo de um dos componentes da turma, o Eli-Sujismundo (qual seria a razão deste apelido, hein?)... Nosso bate papo não era em nenhum chat da internet, mas muitas vezes varávamos a madrugada conversando. Jamais usamos drogas. Naquela época, não íamos além de umas cubas libres e também do cigarro. Também havia muitas brincadeiras tais como Garrafão, Diabão e o pique-ronda que durava, às vezes, até o outro dia. E as peladas? Estas aconteciam onde atualmente está o Jardim da Infância Recanto Infantil e a Creche Mahatma Gandhi e eram realizadas quase que diariamente a não ser quando faltava algo muito importante: A bola. Hoje olho pela janela e vejo meu sobrinho Leidson e seus amigos em uma animada pelada lá no pátio do terreno vizinho. Que saudade daqueles tempos! FIGURAS PITORESCAS Como podem ver, a turma era grande. Porém, alguns se destacavam pelas atitudes um tanto peculiares (pra não dizer cômicas), embora essa fosse uma peculiaridade que pertencia a todos. TADEU Chamava-se José Tadeu de Paula. Certa vez, estávamos todos reunidos no bar do Pedrinho e, enquanto eu bebericava uma Coca Cola, conversava com meus amigos a respeito dos planos para o sábado que se aproximava: “Gente, onde ‘nóis’ dança? -falou Totonho. Edson, encostado no balcão e fumando o seu cigarro, respondeu: “Eu sei de um lance ai. Fui convidado para um baile lá no bairro Conforto.” Sempre que isso acontecia, o convite era extensivo a toda a turma e ai de quem não participasse o fato: a bronca seria geral! Mas era comum que todos participassem. Já passava das seis horas da tarde e o papo transcorria na mais perfeita paz e harmonia...até que um grito se ouviu ao longe: “Vasco!! ///Hu-rra!!/// Quem é o bom do final?? Vasco!!///Hu-rra!!! /// .” Pronto! Acabou a tranquilidade. O dono daqueles gritos de guerra não poderia ser outro: Tadeu! Trabalhava a semana inteira num serviço pesado lá no S.A.A.E. Durante toda a semana, Tadeu era bem calmo e pacato. Além do mais, era de pouca conversa. No futebol, fazia o meio de campo de nosso time e era considerado um bom jogador. Seus passes eram sempre endereçados a mim e muitos dos gols que marquei era ele que me descobria livre entre os zagueiros. Tadeu era uma figura! Dominava a bola no meio de campo e, de primeira, lançava: “Vai em cima, cambada! Faz, Anésio!” Assim era nosso saudoso amigo, sempre muito educado. Mas, quando chegava sexta-feira, saía do serviço com seus colegas de trabalho e enchia a cara. Era esse o seu único vício. E era assim que ele chegava ao bairro. Quando isso acontecia, ele se transformava. Aquele rapaz calmo e educado dava lugar a um bêbado que gostava de arrumar encrencas (pois agora ele também era muito valente) como em uma vez quando ele deu uma paulada na cabeça do Aílton, que havia feito uma covardia com ele. Foi assim: Ailton estava bastante embriagado e, junto com seu irmão Helvécio, cismaram de dar um banho de (pasmem os senhores) álcool no Tadeu. Isso só não ocorreu porque eu prontamente intervi e o tirei de lá. No outro dia, ele ficou sabendo; esperou o Aílton e deu-lhe a paulada. -“Eita Lima Duarte, sô!”- (Lima Duarte era o nome que ele dava ao porrete que trazia consigo). Se, por acaso, estivéssemos em um baile e ele descobrisse, era o maior sufoco. Assim foi num dia de baile na casa do seu Paulo, um amigo de seu pai e conterrâneo lá de Lima Duarte. Vejam o que ele aprontou: O baile estava animado e todos nós divertíamos bastante. Tudo ia bem até que ele chegou. Chamou uma jovem para dançar e esta, que já conhecia a fama dele, ficou com medo mas, para não arrumar confusão, aceitou a dança. “Ston-ton-ton, ston-ton-ton”- fazia ele com a boca e, levantando lateralmente ora o pé direito ora o esquerdo, rodopiava pela sala da casa do seu Paulo. O mais engraçado foi que, ao chegarmos, Seu Paulo perguntou por ele e o Gaspar, que era seu irmão, disse que Tadeu estava maneirando na bebida. Eu quase soltei uma boa gargalhada naquela hora. Se Seu Paulo visse como o tínhamos deixado lá na praça do final do Retiro... Infelizmente, ele não durou até ver a sua historia neste livro pois, anos mais tarde, veio a falecer vítima de tuberculose. Nossa ultima conversa foi no dia anterior a sua morte onde tive a oportunidade de falar sobre Jesus para ele. O Jesus que conheci numa igreja onde o próprio Tadeu um dia me convidou a visitar. Saudade, querido amigo. Vascooo!! Quem era o bom da boca do final ?? TOTONHO E EDSON Que dupla formavam aqueles dois! Totonho, um mulato alto e forte que sempre gostou de se vestir de uma forma que, diria eu, um tanto espalhafatosa. Naquela época, estava em moda as tais Pantalonas e ele competia principalmente com o Edson quem iria varrer a rua...ops, melhor dizendo, quem usaria a boca da calça mais larga. Dessa competição, participavam apenas Totonho, Edson e Eli-Sujismundo. O restante da turma não era muito ligado nessas coisas, não. Edson era a outra parte daquela dupla que sempre nos divertia aprontando todas com nosso amigo. Muito gozador, fazia de todos nós vítimas da sua língua felina. Mas não ficava só nisso não... Certa vez, Totonho fez um passeio à cidade de Lima Duarte e, quando voltou, trouxe consigo o retrato da sua última conquista. A foto mostrava uma moça muito bonita e bem vestida que, segundo nosso amigo, chamava-se Elza e era filha de fazendeiro. Ela era também a professora do pequeno lugarejo chamado Arraial dos Lopes. Aquela foto foi passada de mão em mão como um troféu pelo nosso amigo, todo orgulhoso. Antônio e Roberto, que viajaram com ele e eram antigos moradores do lugar, confirmavam tudo o que Totonho dizia. Mas a mentira sempre teve pernas curtas e foi assim que, numa manhã de domingo, quando todos nós estávamos ouvindo musica e conversando em frente ao caminho que levava à casa do Totonho, uma jovem se aproximou e perguntou se conhecíamos Antônio José Gonçalves (que para todos nós não era outro senão nosso amigo Totonho). Quando a jovem nos informou ser lá de Lima Duarte, entendemos tudo: A única verdade era que realmente seu nome era Elza, mas seu rosto e seu aspecto nada tinham a ver com aquela moça do retrato que até hoje não sabemos de onde Totonho tirou. Edson conduziu a jovem até a casa de nosso amigo, deixando-nos ali com aquela decepção. Totonho ia ver só!... Passaram se mais ou menos uma hora quando os três retornaram e o nosso amigo apresentou sua namorada, agora em carne e osso. Bonitinho, que estava conosco e que perdia um amigo mas não perdia a piada, lançou essa: “Totonho, sua namorada não é aquela do retrato, não?” “Claro que é. Por quê?” “Não, não. Você está enganado! Ela não tem nada a ver com aquela fotografia.” Todos caíram na gargalhada enquanto Totonho soltava chispas de fogo pelos olhos. Não que abusássemos daquela jovem que nada estava entendendo, mas sim de nosso amigo pra deixar de ser cascateiro e mentiroso. O namoro dos dois continuou firme por muito tempo ate que Edson resolveu aprontar: Totonho não era nenhum analfabeto, mas achava que Edson poderia escrever palavras mais bonitas, já que ele era um grande galanteador e também muito conquistador. Durante um bom tempo ele escreveu cartas em nome de Totonho, até que um dia o inevitável aconteceu: Eu estava assentado no banco da praça, ao lado do ponto do ônibus, quando Totonho desembarcou e veio furioso ao meu encontro: “Cadê aquele safado do Edson?? Vou arrebentar a cara dele!” Foi então que fiquei sabendo: Na ultima carta, Edson inventou que Totonho era mau elemento, não gostava de trabalhar e, além disso, morava com uma menina da nossa cidade. Como se não bastasse, Edson declarou estar apaixonado pela garota, dizendo que, em breve, iria visita-lá, pois era ele quem escrevia aquelas cartas que ela tanto gostava. Era um verdadeiro canalha nosso amigo Edson. Totonho viveu uma terrível situação junto à família da moça, pois o pai e os irmãos dela por pouco não lhe deram uma boa sura em sua ultima viagem àquela cidade. E foi assim que terminou o romance de Totonho e Elza. E vamos ao encontro dos dois amigos, agora, desafetos: Edson possuía muita lábia e, aos poucos, foi domando a fera: “Sabe Totonho, tudo foi apenas uma brincadeira. Eu não esperava que isso iria acontecer. Além do mais, eu não poderia saber que você iria lá por estes dias. Não deu tempo de desfazer a brincadeira, pois você chegou bem antes.” Aos poucos, Totonho foi se acalmando e, logo depois, os dois já planejavam aprontar uma para o Bonitinho. Ele teria que pagar aquela do retrato! Aquela dupla era, de fato, única. E nunca houve outra igual naquela turma. Capítulo III ATIVIDADES Tínhamos o nosso point: o meio fio em frente à casa do Zé mineiro. Não havia praça no final do bairro Retiro e, por isso, ali era nosso verdadeiro point. Era ali que reuníamos para conversarmos e, às vezes, íamos até a madrugada rindo e pregando peças uns nos outros. Tudo era motivo de zoeira (deixe-me usar esse termo atual) principalmente quando alguém chegava vestindo uma roupa bem espalhafatosa como faziam meus amigos Totonho e Eli-Sujismundo, que uma noite se apresentou com uma calça que eu apelidei de “calça de palhaço”. Foi um bom sarro... E quando alguém levava um fora do namorado ou da namorada?? Era quase impossível ficar triste no meio daquela turma. Muitas vezes a reunião começava bem cedo e então definíamos as nossas atividades daquele dia: Que tal jogarmos uma pelada?? Nada disso! Hoje vamos à casa de seu Domingos... SEU DOMINGOS Seu Domingos era o proprietário de um sitio bem afastado, o qual cultivava com muito amor. Tinha muito trabalho, mas sentia-se recompensado ao contemplar aquelas árvores frutíferas e também a criação de porcos, galinhas, gansos e etc. Ajudado nas tarefas pelo filho Vicente, que nós chamávamos de Filamengo, Seu Domingos era um senhor de idade e se alegrava sempre com as nossas visitas. Era então a maior farra! Nadávamos e pescávamos em um riacho que passava nos fundos do sitio e nos fartávamos com tantas frutas tais como: bananas, laranjas, abacaxis, jabuticaba, mas principalmente goiabas, muitas goiabas e de qualidade especial. Comíamos de tudo que achávamos pela frente, inclusive os peixes que pescávamos lá no riacho. Quando chegava em casa, minha mãe ficava preocupada pois, apesar de ter preparado um ótimo almoço, eu nem tocava na comida. “Esse menino ainda vai ficar doente, quase não se alimenta.” Também pudera... As frutas eram conseguidas através de um ardil muito engraçado. Íamos sempre em grupos com mais de dez jovens e cada um enchia uma sacola de frutas que Seu Domingos contava e cobrava bem baratinho. Então fazíamos o seguinte: Enquanto alguns levavam as sacolas para ele ver, outros atravessavam a cerca com sacos abarrotados de frutas. Mas Seu domingos não era nenhum bobo. Ele sabia de tudo. Apenas fingia ignorar, não ligava. Sem saber, nós o recompensávamos com nossa alegria que agitava aquele lugar tão tranquilo e sossegado. Muito obrigado Seu Domingos, Dona Divina, Filamengo, que hoje são apenas boas lembranças que o tempo não conseguiu apagar. O FUTEBOL EM SANTA RITA DE CASSIA Havia um lugarejo próximo ao bairro que morávamos, chamado Santa Rita de Cássia e era habitado por muitas famílias oriundas do estado de Minas Gerais. Até hoje preservam seus costumes antigos, entre eles as festas Juninas que eram patrocinadas pela igreja Católica local. Carlim-Fumo e eu éramos atletas do time de futebol do lugar e, numa daquelas festas, ocorreu algo interessante: Era o final do campeonato e nos sagramos campeões em um jogo emocionante em todos os sentidos: Vencíamos o jogo pelo placar de 2x1 e o time adversário nos fustigava furiosamente já que, por ter feito melhor campanha, o empate lhe daria o titulo. Faltando poucos minutos para o término do jogo, a bola voou à linha de fundo depois de um ataque fulminante dos adversários e foi ai que eu resolvi aprontar: Atrás da nossa meta passava a rua principal e, naquele momento, fui em busca da bola. Só que eu não tinha nenhuma pressa em devolvê-la ao jogo e vim lentamente caminhando com ela presa aos pés. O atacante do outro time partiu pra cima de mim, furioso, e foi driblado lá na rua mesmo por mim. Irado, veio em cima de novo e novamente foi driblado. A enorme torcida foi ao delírio, pois agora o show era lá na rua...e tome dribles! O árbitro deixou-se levar por aquela cena inusitada e só deu o apito final depois de muito tempo, quando o jogo terminou e começou a batalha campal. Foi soco pra todo lado, pauladas, rasteiras e brigava todo mundo: homens, mulheres e crianças. Por incrível que pareça, nem eu nem Carlim-fumo nos envolvemos na briga. Fomos saindo de fininho e corremos para a cachoeira a fim de nos banharmos e nos trocarmos para a festa que lá perto da igreja já estava para começar. Fomos recebidos como verdadeiros ídolos locais, pois meu amigo e eu havíamos jogado bem e merecíamos o titulo de campeão. Aquela sessão de dribles lá no meio da rua era o comentário do dia e, por onde eu passasse, era cumprimentado pelos moradores do local menos pelo Barbosinha, capitão do time adversário, que dizia a todos: - Na próxima eu pego ele! Santa Rita de Cássia é hoje um grande centro produtor de hortaliças. E O ÔNIBUS FOI PRO BREJO Era o ultimo ônibus daquele dia, já passava das dez horas da noite e toda a turma já estava dentro do coletivo. O barulho era infernal, pois o Paulinho, meu irmão, que não jogara por estar machucado, havia levado muitas cornetinhas de plástico e distribuído a todos, afinal, éramos os campeões e estávamos ainda festejando. O motorista, a todo o momento, dava algumas freadas bruscas para que ficássemos quietos, mas que nada! Só fazia aumentar a bagunça. De repente, o ônibus sai da estrada e lá vamos nós rolando abaixo até o brejo. Felizmente, a ribanceira não era muito alta, mas algumas pessoas se machucaram. Eu havia levado uma forte pancada na cabeça e, por alguns momentos, me vi totalmente ensanguentado, ainda mais que usava uma camisa branca. Meu amigo João-Gandaia, companheiro inseparável, me tranquilizou dizendo: _Calma, Anésio, que isso ai é apenas barro vermelho... Saímos do coletivo sinistrado e agora minha preocupação era ajudar a socorrer os feridos e saber o que havia acontecido com o motorista do ônibus. A empresa enviou o socorro, acionada pelo próprio motorista e, pouco depois, fomos enviados ao pronto-socorro. Depois de comprovar que não havíamos machucado seriamente, fomos todos à delegacia para os exames de praxe...e também para ouvir a bronca do Sr. delegado. Capítulo IV VAMOS A LA PLAYA? Zé Mineiro organizou uma excursão à praia de Muriqui e programou a saída para a manhã de domingo. Para acordar o pessoal (pasmem os senhores) houve uma queima de fogos que acabou acordando não só o pessoal da excursão, mas também todo o bairro. Quem não ia ao passeio ficou uma fera. Mas graças a esse inusitado despertador, o ônibus saiu na hora certa e lá fomos nós. Mesmo assim, Totonho, considerado um grande dorminhoco, quase perdeu a condução. Dentro do ônibus reinava a maior algazarra com muita batucada ao som de violão, pois em nosso grupo havia dois bons instrumentistas: João Gandaia e eu. O pior de tudo era que o Paulinho estava lá com as infernais cornetinhas. A musica que cantávamos era: ‘Se este ônibus não virar, olê, eu chego lá...’ (vocês se lembram do desastre em Santa Rita de Cássia, né ?). Havia também outro coro: ‘Motorista, se eu fosse como tu...’etc. Chegamos cedo à praia e vejam só que vexame: Alguns fogos foram estocados, anunciando a chegada daquela turma que ali ia aprontar... Ao desembarcarmos do ônibus, ouvimos as instruções: Tomem cuidado! Não abusem do perigo nem da bebida! O ônibus sairá as cinco em ponto! Caímos na água e nos esbaldamos também na areia, aproveitando bastante a oportunidade. O aviso para não abusar da bebida não fora muito bem atendido, já que Totonho e Daniel passaram dos limites. O primeiro dormiu até a hora da saída do ônibus e Daniel quase morreu afogado. Foi assim: A dupla havia ficado no ônibus dormindo enquanto nos divertíamos até que, quase à hora de partirmos, avistei ao longe, algo boiando nas águas e sendo levado pela maré que, felizmente, estava bem calma. Lili e eu fomos averiguar e não deu outra: Era o próprio Daniel. Desacordado, mas segurando em suas mãos uma garrafa, o inconsequente foi salvo por nós e colocado dentro do ônibus que agora ficaria trancado até o momento da saída. TURMA DO FINAL X TURMA DA IGREJINHA A turma da igrejinha era a mesma que tomara parte no comício do outro candidato e também nossos desafetos por outros motivos, entre os quais, a rivalidade no campo das conquistas, pois assim como namorávamos as minas deles, eles também namoravam as nossas. Além do mais, nós os considerávamos metidos a ‘riquinhos’. Eram também melhor organizados socialmente, pois pertenciam a um Grupo denominado JOC (Juventude Operaria Cristã) que era ligado a igreja católica. E eu não podia esquecer o clube Ipanema que, para não perder o costume, também era cenário de muita confusão entre as duas turmas rivais. Não foi nenhuma casualidade encontrar com aquela turma na praia, pois a mesma era o reduto comum da cidade de Volta Redonda e Barra Mansa. E, para nós, o que aconteceu naquele lugar foi um clássico regional e vocês não vão se surpreender se eu contar no que deu esse encontro: Polícia! Caminhávamos pela orla da praia Jorge-Perereca, Lili, Paulo César e eu quando encontramos Tim, Adelson e Cormário que estavam tentando organizar uma pelada na areia. Foi então ~ 31 ~ que, esquecendo momentaneamente nossas diferenças, aceitamos participar do jogo. Foram formados os dois times e o clássico do bairro Retiro começou lá em Muriqui. NOVA BATALHA NA AREIA O jogo estava animado e nosso time estava melhor naquele dia, marcando o primeiro gol num chute de Paulo César. O segundo numa arrancada de Lili e, assim, rapidamente o terceiro através de um pênalti cobrado por mim. O placar de 3 x 0 foi só o começo. O time deles não era tão ruim e logo marcou dois gols quase que instantaneamente. As disputas foram ficando mais acirradas até que, numa entrada mais forte minha no Cormário, começou o entrevero e a turma do ‘deixa-disso’ tratou de apartar. A partida continuava e, em volta do campo improvisado na areia, já havia um bom número de espectadores que vibravam a cada jogada ou qualquer disputa mais ríspida. Tomei uma bola do Adelson que era o melhor deles e parti célere para o gol. ~ 32 ~ Mas foi ai que notei algo estranho: Eu não recebera perseguição de ninguém. Foi então que, quando dei por mim, a bulha estava formada lá atrás e o pau cantando. Quando o Tim correu para o meu lado, dei lhe um soco na cara e entrei no meio do bolo. (Fiquei sabendo depois que ele queria apenas evitar que eu entrasse na briga a qual ele tentava separar). A polícia chegou e os dois times foram para o distrito, o que nos valeu a bronca da autoridade: “Vocês saem lá de Volta Redonda para brigarem aqui?! Quem é o responsável??” (agora ao escrever isso, lembrei-me do Tiririca quando pergunta “Quem é o cantô??”) Mais uma vez, Zé Mineiro teve que entrar em ação para nos defender. Mas, no fim, tudo terminou bem. Às cinco horas em ponto nosso ônibus deixava a praia. O pedido de Zé Mineiro era uma ordem e não havia o que se discutir. Capítulo V MAIS HISTÓRIAS MOISÉS E A CRUZ Moisés subiu o monte e carregou a cruz? Como assim? Eu explico: Estávamos no nosso point quando um jovem meio “22” chamado Moisés sentou-se ao nosso lado e ficou durante um bom tempo contemplando uma cruz que fora colocada lá no alto do morro pelo Daílton que, naquela época, fazia um trabalho religioso no bairro. Ele colocara várias cruzes de madeira naquele morro, representando a via sacra que terminava no cume do mesmo, onde ergueu uma grande cruz que era vista lá embaixo, onde estávamos. Na época da Semana Santa, muita gente acompanhava em procissão aquele trajeto guiado por Daílton, que recebia pessoas de muitos lugares diferentes. Aquele evento anual já era tradição e até eu já havia participado algumas vezes, mas não era muito ligado nessas coisas e, por isso, Dailton me chamava de ateu. Mas vamos aos fatos: Moisés olhava fixamente para a cruz e falou naquele momento: - Qualquer dia eu vou lá em cima e derrubo aquela cruz! - Que nada! -Respondi- “O Daílton te mata!” – continuei, provocando Moisés que, dias antes, havia brigado com o religioso. Aquilo foi o bastante para Moisés subir o morro, arrancar do lugar a cruz e carregá-la nos ombros até onde estávamos. Daílton ficou uma fera e partiu para cima do infeliz, batendo e amaldiçoando-o. Ninguém nunca se convenceu de que eu não tive nada a ver com aquele fato. “Isso foi idéia daquele ateu” - dizia Daílton... VAMOS AO MARACANÃ? Como disse anteriormente, nossa turma era muito família, ou seja, era composta basicamente por irmãos: a dupla Carlim-Fumo e Paulo César, o quarteto Jorge, Lili, Venina e Nilzete e o trio formado por Paulinho, Regina e eu (somos quatro ao todo, mas nossa irmã mais velha já era casada e, portanto, não fazia parte da turma). Sempre fomos muito unidos e, juntos, aprontávamos muito. Um dia, fomos assistir ao clássico Fluminense x Vasco imprensados naquele Carmanguia que, habitualmente, transportava apenas meu cunhado Fabio e minha irmã Regina. Sardinhas em lata estavam melhor acomodadas do que Paulinho e eu que, com as pernas encolhidas, viajávamos no banco traseiro. Meus irmãos e meu cunhado eram tricolores e suportavam numa boa aquele sacrifício. Mas o pior estava por vir: Na descida da serra, o carro dá um defeito e pára. Meu cunhado desce e vai verificar : “Não vai dar! A bomba de gasolina pifou. Só trocando mesmo...” Vejam bem: quase na hora do jogo e nós ali encalhados naquele lugar, em pleno domingo. Alguém se aproxima e dá o endereço de um mecânico e, quanto à peça que teria de ser substituída, “Vamos dar um jeito”- disse o homem. Com o radio ligado na radio Tupi, ouvimos que o jogo ia começar e o mecânico ali, tentando consertar o carro enquanto nós esticávamos as pernas doloridas. Ao término do primeiro tempo, desistimos de ir ver o jogo e voltamos de ônibus para casa. Imagine só: sairmos de casa para ouvir o clássico pelo radio. Ninguém merece... ZÉ MINEIRO E O BURRRÃO Eu bem que avisei que iria falar novamente desse grande amigo: Zé Mineiro gabava-se de, na sua mocidade, ter sido ótimo peão amansador de burros nas fazendas que trabalhou em Minas Gerais, Mato Grosso e até em Goiás. Nós ouvíamos, embevecidos, aquelas historias principalmente pela maneira que eram narradas. Ate que um belo dia, o profundo conhecedor de animais recebeu a visita de um cigano montado em um belíssimo animal. Era um burro muito bem arriado e enfeitado, que causou, à primeira vista, grande admiração em todos nós. Mas quem entendia de animais era Zé Mineiro, pra rimar peão e boiadeiro. O cigano convidou-o para dar um repasso no magnífico animal e lá se foi o velho peão em disparada, tirando até faíscas no asfalto, sumindo no fim da estrada. Quando ele retornou, fez com que o animal empinasse demonstrando grande habilidade sobre a cela. O cigano então fez a proposta: “Gostou do animal? E uma maravilha não e mesmo?” Negociaram ali mesmo o animal e o cigano foi embora, enquanto todos nós admirávamos a magnífica aquisição. Já era bem tarde e fomos dormir e sonhar com aquele lindo animal. No dia seguinte…than, than, than, than! Chovera toda aquela noite e o animal ficara amarrado do lado de fora da cerca, ficando todo molhado e desbotado. Quando Zé Mineiro foi ver o pobre animal quase teve um troço: Nada mais restava daquele lindo animal. Amarrado à cerca estava um tremendo pangaré que não tinha nada a ver com o magnífico burro. Era o mesmo, mas a chuva havia tirado a maquiagem feita pelo cigano e assim Zé Mineiro foi logrado. Quanto ao cigano, dou um doce para quem souber seu paradeiro. Nosso amigo não se deixou abater pela gozação da qual se tornou vitima e, assim, o pangaré se transformou no nosso amigo Burrrão. Sim, era desta maneira que nós o batizamos: Burrrão! O Burrrão vagava pelas ruas com seu passo cansado ate à noite, quando era recolhido a um paiol, onde se abrigava. Quando ele não voltava para casa, Zé Mineiro perguntava. Alguém viu o meu Burrrão? Quando alguém o encontrava, logo o conduzia até a casa do seu dono. No fundo, o Burrrão era de todos nós...até que um dia ele sumiu pela estrada. “Alguém viu o Burrrão por ai??” Nada! Até que, depois de muitos dias, Jorge-Perereca saiu com essa: “Seu Zé, encontrei o Burrrão!” “Onde??” - perguntamos todos ansiosos: “Lá no rio Paraíba. Ele estava nadando de um jeito muito especial” “Como assim jeito especial?” - perguntamos todos bem aflitos. “Tava nadando lá no rio com as quatro patas para cima”- respondeu. “O meu Burrrão morreu!!!” - Exclamou Zé mineiro, desesperado. E assim acabou o nosso Burrrão... Bem amigos, como dizem, o que é bom dura pouco e já estamos chegando ao final deste livro. Enfim vocês irão entender a razão que me levou a dar-lhe este título. Capítulo VI MORREU ALGUÉM AI? Zé mineiro planejara a última excursão e todos nós estávamos envolvidos nos preparativos: venda de passagens, aluguel de ônibus e tudo o mais. A casa de Zé Mineiro era só animação e, entre um causo e outro, vivíamos a expectativa de um fim de semana maravilhoso. Enfim chegou o grande dia! O ônibus estava lotado e todos aguardávamos, ansiosos, a partida e, conforme dita a tradição, fomos despertados naquela manhã pelos famosos rojões que já eram comuns em nossas excursões. Nem preciso repetir que quem não ia à excursão acordava furioso naquela hora. Partiu o ônibus e a batucada começou. No trajeto, a musica era esta: “Motorista, se eu fosse como tu, tirava o pé do freio e corria pra chuchu”... além de outros sucessos da época. Chegamos, enfim, e ouvimos as mesmas instruções de sempre. Logo após, caímos na água que estava uma delicia e ficamos um bom tempo curtindo aquelas ondas.~ Quando deu fome, repartimos a comida que, como autênticos farofeiros, havíamos levado: Frango assado, farofa, carne assada e muitos sanduíches regados a Coca Cola e algumas cervejas. Depois do almoço, fomos passear na orla da praia e ver as minas que eram muitas àquela hora do dia, que estava magnífico. Após o itinerário da orla, voltamos todos para a água e lá ficamos até o pôr do sol. O dia estava terminando e até aquele momento tudo era só alegria. Mas o pior estava por vir... Chegou a hora do retorno e todos se dirigiram para as proximidades do ônibus como fora previamente combinado. Zé Mineiro fez a conferência, chamando os nomes um a um. Quase todos estavam presentes menos um: o Caramba! “Onde está esse menino, gente??” – perguntava, aflito, Zé Mineiro. As horas foram se passando e nada. Preocupados, saímos a sua procura. Aos poucos, fomos tomando consciência do ocorrido: Nosso amigo estava desaparecido! Entramos todos no ônibus para aquele difícil regresso enquanto um véu de tristeza e preocupação caía sobre nós: O que fazer naquele momento tão difícil para todos?? Zé Mineiro conduziu o ônibus até o posto do Salvamar e lá ficou para tomar as devidas providências enquanto nós retornávamos para casa cabisbaixos e tristes. Gente, o que passamos no interior daquele ônibus não desejo ao pior inimigo se, por acaso, tiver algum. A nossa chegada já estava sendo aguardada com muita ansiedade, pois não sei como a terrível noticia nos precedeu naquele dia. E agora? Quem daria a noticia aos pais de Caramba?? Seu Ferreira era um homem muito tranquilo, motorista da prefeitura há muitos anos e, segundo ele, jamais havia se envolvido em algum acidente de trânsito. Também pudera; Quem dirigia daquela maneira seria quase impossível se envolver num acidente. Pra se ter uma ideia, quando íamos para a escola e ele nos oferecia carona, sempre arrumávamos um jeito de recusar, pois poderíamos chegar atrasados naquele dia. Assim era o pai de nosso amigo que, naquele momento tão difícil, sabia apenas repetir: “E agora? Quem vai dar conta do meu Ricardo (Ricardo era o nome de batismo do Caramba)? Onde está meu filho?” Neste momento pude perceber que existem certas pessoas que possuem grande controle emocional. Regina, irmã de nosso amigo, não duvidou nem por um momento que ele ia voltar para casa. Ainda que todas as circunstâncias nos dissessem o contrário. Aquela noite foi de vigília para nós. No dia seguinte, bem cedo, era grande o movimento em nossa rua e em ambas as casas: tanto a de Zé Mineiro como a do Caramba, já que ficavam uma de frente para a outra. A comunicação era muito difícil pois, naquela época, o telefone ainda não havia chegado em nossas casas. Enquanto Zé Mineiro, lá no Rio de Janeiro, passava um mau pedaço, nós aqui, em Volta Redonda, sofríamos ansiosamente e aguardávamos a chegada do corpo de nosso querido amigo. Já passava das três da tarde. Carlim-fumo, eu e os demais estávamos assentados no banco da praça comentando o trágico desaparecimento de nosso amigo quando, de repente, Carlim-fumo (que é negro, mas ficou quase branco) sem fala e com os olhos arregalados, fitou um ponto qualquer da estrada que desembocava na praça do ponto final do ônibus. Ele estava rígido e estático. Sua boca tentava pronunciar algo incompreensível a todos nós. Foi assim que, logo aquele cara tão medroso, pôde ver o que, até mesmo para nós, era uma autêntica assombração. Sim, meus amigos. Lá estava ele, vestido com uma roupa estranha que, com certeza não era a dele: O famoso, o único, o nosso amigo Caramba!! Quando viu aquela multidão na rua e em sua casa, aproximou-se da janela, e olhando para dentro da sala, pronunciou naquele momento a célebre frase que deu origem ao titulo deste livro: “MORREU ALGUEM AÍ?? O que esta havendo aqui??” Nem preciso dizer o espanto que essa frase dita pelo então desaparecido causou em todos que estavam naquela casa. Segundo ele, o que aconteceu foi o seguinte: O maluco e irresponsável encontrou-se com seus primos que moravam em Bangu e foi até lá com eles para depois voltar de ônibus para casa (Ao contar isso na maior naturalidade do mundo, sem se dar conta de tudo o que passamos, ele quase foi linchado ali mesmo por todos os presentes). Zé Mineiro, que fora avisado, retornou aliviado e logo relatava para nós tudo que havia sofrido lá no Salvamar até receber aquele telefonema. Bem amigos, antes de chegarmos ao final desse livro, eu não poderia deixar de narrar o grande encontro, pós-reaparecimento, entre Caramba e Zé Mineiro: CARAMBA X ZÉ MINEIRO Zé Mineiro chegou em casa muito cansado e aborrecido com a irresponsabilidade de Caramba. Comentava com seus filhos: “Vocês nem imaginam o que eu passei lá no Rio de Janeiro. Querem saber de uma coisa? Depois desta eu não vou mais organizar nenhuma excursão! Além do mais, eu nem quero ver aquele maluco na minha frente!” Zé mineiro foi dormir aquela noite, ou melhor, tentar dormir já que, segundo ele próprio disse em relato posterior, tivera muitos pesadelos naquela noite. Acordou um pouco mais tarde e as visitas foram chegando para dar apoio moral ao nosso amigo. “E ai seu Zé, já está mais tranquilo?” - Perguntou Jorge-perereca “Graças a Deus, sim. Mas custei a dormir e tive muitos pesadelos. Também, quem poderia imaginar uma maluquice dessa? Se eu pego esse infeliz de jeito, não sei não...” Por incrível que possa parecer, adivinhem quem chegou em seguida?? Ele mesmo: o Caramba! Com as mãos para trás, colocou a cabeça no vão da porta que estava entreaberta e falou: “Com licença seu Zé, posso entrar?” Zé Mineiro olhou incrédulo para aquela figura e seus olhos corriam de um lado para o outro sem saber o que dizer enquanto em todos nós reinava a maior expectativa de saber qual reação Zé Mineiro haveria de ter. Caramba deu as suas explicações, mas como convencer a todos e principalmente Zé Mineiro, que comera o pão que o diabo amassou lá no Rio de Janeiro? Mas, aos poucos, os ânimos foram se acalmando e logo todos conversávamos alegremente. Toda aquela raiva havia se dissipado e Zé Mineiro comentava: “Foi melhor assim! Felizmente esse porcaria está vivo e hoje não vai sair daqui nenhum enterro.” ...Será?? Quando tudo parecia serenado e explicado vejam só o que o louco do Caramba aprontou: Chamou Zé Mineiro num canto e falou o seguinte (não, eu sei que vocês não irão acreditar, mas que ele falou, isso falou): “Seu Zé, eu queria dizer para o senhor que como eu paguei vinte cruzeiros pela passagem e não voltei no ônibus. o senhor deveria me devolver a metade do dinheiro.” Não acreditamos no que acabamos de ouvir! Muito menos Zé Mineiro, que respondeu furioso: “Eu vou e quebrar sua cara, seu safado!!” E foi em cima do Caramba com toda a vontade. Se a gente não segura, o enterro do Caramba teria sido apenas adiado pela mudança de motivo da sua morte. Mas Zé Mineiro era um grande homem e logo já estava rindo e contando outra de suas historias que muito nos alegravam: “Uma vez, lá em Goiás, aconteceu o seguinte...” Totonho então falou: “Pronto, começou tudo de novo! Seu Zé, já pensou quando o senhor contar para os outros a historia do Caramba?” Foi aí que, naquele momento, pensei: “Um dia escrevo esta historia...” Bem amigos, essa foi a nossa historia. A historia de um grupo de jovens que não precisava usar nenhum tipo de droga ilícita e muito menos gastar tanto dinheiro para se divertir. Infelizmente, hoje os tempos são outros e outros são os valores considerados pela juventude atual. Meu desejo ao escrever este livro é que todos nós que convivemos aqueles momentos inesquecíveis pudéssemos um dia relembrar ao lado de nossos filhos. Quem sabe como Zé Mineiro, na varanda de nossas casas, cercados pelos nossos próprios filhos. Um dia tudo isso acabou. Zé mineiro se mudou, mas deixou em nós toda a saudade, principalmente após sua morte. Totonho, Tadeu, Lia e Venina também não estão mais entre nós. E o restante daquela turma se dispersou pelos caminhos da vida. O local denominado FINAL DO RETIRO nunca mais foi o mesmo, embora ainda hoje exista ali uma bela praça onde todos nós, os remanescentes, deveríamos nos reunir para lembrarmos os velhos tempos que não voltarão jamais... Fim

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